A «carta aos que não crêem» do Papa Francisco

O jornal italiano “La Repubblica” publicou quarta-feira, 11, uma longa carta do Papa Francisco na qual ele escreve aos que não crêem e lhes assegura que “Deus perdoa a quem obedece a sua própria consciência”.

A carta de quatro páginas é uma resposta ao fundador do jornal, Eugenio Scalfari, que em vários artigos dirigia ao Pontífice algumas perguntas em nome daquele que como ele “não acreditam e não buscam a Deus”.

Eis a íntegra da carta:

|Ilustríssimo Doutor Scalfari, é com viva cordialidade que, embora somente em grandes linhas, gostaria de tentar com esta minha, responder à carta que, das páginas do ‘La Repubblica’, o senhor quis me endereçar em 7 de julho com uma série de reflexões pessoais suas, que depois as enriqueceu nas páginas do mesmo jornal, no dia 7 de agosto.

Agradeço-lhe, antes de tudo, pela atenção com que quis ler a Encíclica Lumen fidei. Ela, de fato, na intenção do meu amado predecessor, Bento XVI, que a concebeu e em grande medida a redigiu, e do qual, com gratidão, eu a herdei, é dirigida não somente para confirmar na fé em Jesus Cristo aqueles que nela já se reconhecem, mas também para suscitar um diálogo sincero e rigoroso com aqueles que, como o senhor, se definem como “um não crente há muitos anos interessado e fascinado pela pregação de Jesus de Nazaré”.

Parece-me, portanto, ser positivo não só para nós, individualmente, mas também para a sociedade em que vivemos determo-nos para dialogar sobre uma realidade tão importante como a fé, que diz respeito à pregação e à figura de Jesus. Penso, particularmente, que existam duas circunstâncias que tornam hoje necessário e precioso esse diálogo.

Isso, aliás, constitui, como se sabe, um dos objetivos principais do Concílio Vaticano II, desejado por João XXIII, e do ministério dos Papas que, cada um com a sua sensibilidade e o seu aporte, desde então até hoje caminharam no sulco traçado pelo Concílio. A primeira circunstância – como referida nas páginas iniciais da Encíclica – deriva do fato que, ao longo dos séculos da modernidade, assistiu-se a um paradoxo: a fé cristã, cuja novidade e incidência sobre a vida do homem, desde o início, foi expressa precisamente através do símbolo da luz, foi muitas vezes rotulada como a escuridão da superstição que se opõe à luz da razão. Assim, entre a Igreja e a cultura de inspiração cristã, por um lado, e a cultura moderna com marca iluminista, de outro, chegou-se à incomunicabilidade. Chegou agora o tempo, e o Vaticano II inaugurou a este propósito a estação, de um diálogo aberto e sem preconceitos que reabra as portas para um sério e fecundo encontro.

A segunda circunstância, para quem procura ser fiel ao dom de seguir Jesus na luz da fé, deriva do fato de que esse diálogo não é um acessório secundário da existência do crente: é, ao invés disto, uma expressão íntima e indispensável dela. Permita-me de citar ao senhor, a propósito, uma afirmação a meu ver muito importante da Encíclica: como a verdade testemunhada pela fé é a do amor – sublinha-se – “resulta claro que a fé não é intransigente, mas cresce na convivência que respeita o outro. O crente não é arrogante; ao contrário, a verdade o torna humilde, sabendo que, mais do que nós a possuirmos, é ela que nos abraça e nos possui. Longe de enrijecer-nos, a segurança da fé nos coloca a caminho e torna possível o testemunho e o diálogo com todos” (n. 34). É este o espírito que anima as palavras que eu lhe escrevo.

A fé, para mim, nasceu do encontro com Jesus. Um encontro pessoal, que tocou o meu coração e deu uma direção e um sentido novo à minha existência. Mas ao mesmo tempo um encontro que foi possível graças à comunidade de fé em que eu vivia e graças aos quais eu encontrei o acesso à inteligência da Sagrada Escritura, à vida nova que, como água que jorra, brota de Jesus através dos Sacramentos, à fraternidade com todos e ao serviço dos pobres, imagem verdadeira do Senhor. Sem a Igreja – acredite-me –, eu não teria podido encontrar Jesus, consciente de que aquele imenso dom que é a fé é custodiado nos frágeis vasos de barro da nossa humanidade.

Ora, é precisamente a partir daí, desta experiência pessoal de fé vivida na Igreja, que eu me sinto à vontade para ouvir as suas perguntas e para buscar, junto com o senhor, os caminhos ao longo dos quais possamos, talvez, começar a percorre um trecho de caminho juntos.

Perdoe-me se eu não sigo passo a passo as argumentações propostas pelo senhor no editorial do dia 7 de julho. Parece-me mais frutuoso – ou, ao menos, é mais natural para mim – ir de certo modo ao coração das suas considerações. Não entro nem mesmo na modalidade expositiva seguida pela Encíclica, em que o senhor entrevê a falta de uma seção dedicada especificamente à experiência histórica de Jesus de Nazaré.
Observo apenas, para começar, que uma análise desse tipo não é secundária. Trata-se, de fato, seguindo a lógica que guia o desdobramento da Encíclica, de fixar a atenção sobre o significado do que Jesus disse e fez, e, assim, em última instância, sobre o que Jesus foi e é para nós. As Cartas de Paulo e o Evangelho de João, aos quais é feita referência particular na Encíclica, são construídos, de fato, sobre o sólido fundamento do ministério messiânico de Jesus de Nazaré, atingindo seu auge resolutivo na páscoa de morte e ressurreição.

Portanto, é preciso se confrontar com Jesus, eu diria, na concretude e na rudeza da sua história, assim como nos é narrado sobretudo pelo mais antigo dos Evangelho, o de Marcos. Constata-se então que o “escândalo” que a palavra e a práxis de Jesus provocam em torno dele deriva da sua extraordinária “autoridade”: uma palavra, esta, atestada desde o Evangelho de Marcos, mas que não é fácil fazer entender bem em italiano. A palavra grega é “exousia”, que na carta remete ao que “provém do ser” que se é. Não se trata de algo exterior ou forçado, mas de algo que emana de dentro e que se impõe por si só. Jesus, com efeito, impressiona, surpreende, inova a partir – ele mesmo o dizda sua relação com Deus, chamado familiarmente de Abbá, que lhe confere essa “autoridade” para que ele a use em favor dos homens.

Assim, Jesus prega “como alguém que tem autoridade”, cura, chama os discípulos a segui-lo, perdoa…coisas todas que, no Antigo Testamento, são de Deus e somente de Deus. A pergunta que mais vezes retorna no Evangelho de Marcos: “Quem é este que…?”, e que diz respeito à identidade de Jesus, nasce da constatação de uma autoridade diferente daquela do mundo, uma autoridade que não tem como fim exercer um poder sobre os outros, mas servi-los, dar-lhes liberdade e plenitude de vida. E isso até o ponto de colocar em perigo a sua própria vida, até experimentar a incompreensão, a traição, a rejeição, até ser condenado à morte, até desabar no estado de abandono sobre a cruz. Mas Jesus permanece fiel a Deus, até o fim.

E é precisamente então – como exclama o centurião romano aos pés da cruz, no Evangelho de Marcos – que Jesus se mostra, paradoxalmente, como o Filho de Deus! Filho de um Deus que é amor e que quer, com todo o seu ser, que o ser humano, cada ser humano, se descubra e viva também ele como seu verdadeiro filho. Isso, para a fé cristã, é certificado pelo fato de que Jesus ressuscitou: não para triunfar sobre quem o rejeitou, mas para atestar que o amor de Deus é mais forte do que a morte, o perdão de Deus é mais forte do que todo o pecado, e que vale a pena gastar a própria vida, até o fim, para testemunhar esse imenso dom.

A fé cristã acredita nisto: que Jesus é o Filho de Deus, vindo para dar a sua vida para abrir a todos o caminho do amor. Por isso, o senhor tem razão, ilustre Dr. Scalfari, quando vê na encarnação do Filho de Deus o eixo da fé cristã. Tertuliano já escrevia: “Caro cardo salutis”, a carne (de Cristo) é o eixo da salvação. Porque a encarnação, isto é, o fato de que o Filho de Deus veio na nossa carne e compartilhou alegrias e dores, vitórias e derrotas da nossa existência, até o grito da cruz, vivendo todas as coisas no amor e na fidelidade ao Abbá, testemunha o incrível amor que Deus tem por cada ser humano, o valor inestimável que lhe reconhece. Cada um de nós, por isso, é chamado a fazer seu o olhar e a escolha de amor de Jesus, a entrar no seu modo de ser, de pensar e de agir. Essa é a fé, com todas as expressões que são descritas pontualmente na Encíclica.

Sempre no editorial do dia 7 de julho, o senhor me pergunta, além disso, como entender a originalidade da fé cristã, uma vez que ela se articula justamente na encarnação do Filho de Deus, em relação às outras fés que gravitam, ao invés disto, em torno da transcendência absoluta de Deus.

A originalidade, eu diria, está justamente no fato de que a fé nos faz participar, em Jesus, à relação que Ele tem com Deus que é Abbá e, nessa luz, à relação que Ele tem com todos os outros seres humanos, incluindo os inimigos, no sinal do amor. Em outros termos, a filiação de Jesus, como ela nos é apresentada pela fé cristã, não é revelada para marcar uma separação intransponível entre Jesus e todos os outros: mas para nos dizer que, n’Ele, todos somos chamados a ser filhos do único Pai e irmãos entre nós. A singularidade de Jesus é pela comunicação, não pela exclusão.

Certamente, segue-se também disso – e não é uma coisa pequena – aquela distinção entre a esfera religiosa e a esfera política que é sancionada no “dar a Deus o que é de Deus e a César o que é de César”, afirmada com clareza por Jesus e sobre a qual, laboriosamente, se construiu a história do Ocidente. A Igreja, de fato, é chamada a semear o fermento e o sal do Evangelho, isto é, o amor e a misericórdia de Deus que alcançam todos os seres humanos, apontando para a meta ultraterrena e definitiva do nosso destino, enquanto à sociedade civil e política cabe a tarefa árdua de articular e encarnar na justiça e na solidariedade, no direito e na paz, uma vida cada vez mais humana. Para quem vive a fé cristã, isso não significa fuga do mundo ou busca de qualquer hegemonia, mas sim serviço ao ser humano, a todo o ser humano e a todos os seres humanos, a partir das periferias da história e mantendo desperto o senso da esperança que impulsiona a fazer o bem apesar de tudo e olhando sempre além.

O senhor me pergunta também, na conclusão do seu primeiro artigo, o que dizer aos irmãos judeus acerca da promessa feita a eles por Deus: ela foi totalmente esvaziada? Esta é – acredite-me – uma interrogação que nos interpela radicalmente, como cristãos, porque, com a ajuda de Deus, sobretudo a partir do Concílio Vaticano II, redescobrimos que o povo judeu ainda é, para nós, a raiz santa a partir da qual germinou Jesus. Eu também, na amizade que cultivei ao longo de todos esses anos com os irmãos judeus na Argentina, muitas vezes na oração interroguei a Deus, de modo particular quando a mente ia ao encontro das recordações da terrível experiência do Holocausto. Aquilo que eu posso lhe dizer, com o apóstolo Paulo, é que nunca falhou a fidelidade de Deus à aliança feita com Israel e que, através das terríveis provações desses séculos, os judeus conservaram a sua fé em Deus. E por isso, a eles, nós nunca seremos suficientemente gratos, como Igreja, mas também como humanidade. Eles, além disso, justamente perseverando na fé no Deus da aliança, lembram a todos, também a nós, cristãos, o fato de que estamos sempre à espera, como peregrinos, do retorno do Senhor e que, portanto, sempre devemos estar abertos a Ele e nunca nos encastelarmos naquilo que já alcançamos.

Chego, assim, às três perguntas que o senhor me faz no artigo do dia 7 de agosto. Parece-me que, nas duas primeiras, o que está no seu coração é entender a atitude da Igreja para com aqueles que não compartilham a fé em Jesus. Acima de tudo, o senhor me pergunta se o Deus dos cristãos perdoa quem não crê e não busca a fé. Posto que – e é a coisa fundamental – a misericórdia de Deus não tem limites se nos dirigimos a Ele com coração sincero e contrito, a questão para quem não crê em Deus está em obedecer à própria consciência. O pecado, mesmo para quem não tem fé, existe quando se vai contra a consciência. Ouvir e obedecer a ela significa, de fato, decidir-se diante do que é percebido como bom ou como mau. E nessa decisão está em jogo a bondade ou a maldade do nosso agir.

Em segundo lugar, o senhor me pergunta se o pensamento segundo o qual não existe nenhum absoluto e, portanto, nem mesmo uma verdade absoluta, mas apenas uma série de verdades relativas e subjetivas, é um erro ou um pecado. Para começar, eu não falaria, nem mesmo para quem crê, em verdade “absoluta”, no sentido de que absoluto é aquilo que é desamarrado, aquilo que é privado de qualquer relação. Ora, a verdade, segundo a fé crença, é o amor de Deus por nós em Jesus Cristo. Portanto, a verdade é uma relação! Tanto é verdade que cada um de nós a capta, a verdade, e a expressa a partir de si mesmo: da sua história e cultura, da situação em que vive etc. Isso não significa que a verdade é variável e subjetiva, longe disso. Mas significa que ela se dá a nós sempre e somente como um caminho e uma vida. Talvez não foi o próprio Jesus que disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”? Em outras palavras, a verdade, sendo definitivamente uma só com o amor, exige a humildade e a abertura a ser buscada, acolhida e expressada. Portanto, é preciso entendermo-nos bem sobre os termos, e, talvez, para sair dos impasses de uma contraposição… absoluta, refazer profundamente a questão. Penso que isso seja absolutamente necessário hoje para entabular aquele diálogo sereno e construtivo que eu esperava no início deste meu dizer.

Na última pergunta, o senhor me questiona se, com o desaparecimento do ser humano sobre a terra, também desaparecerá o pensamento capaz de pensar Deus. Certamente, a grandeza do ser humano está em poder pensar Deus. Isto é, em poder viver uma relação consciente e responsável com Ele. Mas a relação entre duas realidades. Deus – este é o meu pensamento e esta é a minha experiência, mas quantos, ontem e hoje, os compartilham! – não é uma ideia, embora altíssima, fruto do pensamento do ser humano. Deus é Realidade, com “R” maiúsculo. Jesus no-lo revela – e vive a relação com Ele – como um Pai de bondade e misericórdia infinitas. Deus não depende, portanto, do nosso pensamento. Além disso, mesmo quando viesse a acabar a vida do ser humano sobre a terra – e para a fé cristã, em todo caso, este mundo como nós o conhecemos está destinado a desaparecer –, o ser humano não deixará de existir e, de um modo que não sabemos, assim também o universo criado com ele. A Escritura fala de “novos céus e nova terra” e afirma que, no fim, no onde e no quando que está além de nós, mas para o qual, na fé, tendemos com desejo e expectativa, Deus será “tudo em todos”.

Ilustre Dr. Scalfari, concluo assim estas minhas reflexões, suscitadas por aquilo que o senhor quis me comunicar e me perguntar. Acolha-as como a resposta tentativa e provisória, mas sincera e confiante, ao convite que nelas entrevi de fazer um trecho de estrada juntos. A Igreja, acredite-me, apesar de todas as lentidões, as infidelidades, os erros e os pecados que pode ter cometido e ainda pode cometer naqueles que a compõem, não tem outro sentido e fim senão o de viver e testemunhar Jesus: Ele que foi enviado pelo Abbá “para levar aos pobres o alegre anúncio, para proclamar aos presos a libertação e aos cegos a recuperação da vista, para libertar os oprimidos, para proclamar o ano de graça do Senhor” (Lc 4, 18-9).

Com proximidade fraterna,
Francisco



PAPA FRANCISCO CONVOCA PARA DIA DE JEJUM E ORAÇÃO PELA SÍRIA

ANGELUS  
Praça de São Pedro
Domingo, 1º de setembro de 2013

Hoje, queridos irmãos e irmãs,

queria fazer-me intérprete do grito que se eleva, com crescente angústia, em todos os cantos da terra, em todos os povos, em cada coração, na única grande família que é a humanidade: o grito da paz! É um grito que diz com força: queremos um mundo de paz, queremos ser homens e mulheres de paz, queremos que nesta nossa sociedade, dilacerada por divisões e conflitos, possa irromper a paz! Nunca mais a guerra! Nunca mais a guerra! A paz é um dom demasiado precioso, que deve ser promovido e tutelado.

Vivo com particular sofrimento e com preocupação as várias situações de conflito que existem na nossa terra; mas, nestes dias, o meu coração ficou profundamente ferido por aquilo que está acontecendo na Síria, e fica angustiado pelos desenvolvimentos dramáticos que se preanunciam.

Dirijo um forte Apelo pela paz, um Apelo que nasce do íntimo de mim mesmo! Quanto sofrimento, quanta destruição, quanta dor causou e está causando o uso das armas naquele país atormentado, especialmente entre a população civil e indefesa! Pensemos em quantas crianças não poderão ver a luz do futuro! Condeno com uma firmeza particular o uso das armas químicas! Ainda tenho gravadas na mente e no coração as imagens terríveis dos dias passados! Existe um juízo de Deus e também um juízo da história sobre as nossas ações aos quais não se pode escapar! O uso da violência nunca conduz à paz. Guerra chama mais guerra, violência chama mais violência.

Com todas as minhas forças, peço às partes envolvidas no conflito que escutem a voz da sua consciência, que não se fechem nos próprios interesses, mas que olhem para o outro como um irmão e que assumam com coragem e decisão o caminho do encontro e da negociação, superando o confronto cego. Com a mesma força, exorto também a Comunidade Internacional a fazer todo o esforço para promover, sem mais demora, iniciativas claras a favor da paz naquela nação, baseadas no diálogo e na negociação, para o bem de toda a população síria.

Que não se poupe nenhum esforço para garantir a ajuda humanitária às vítimas deste terrível conflito, particularmente os deslocados no país e os numerosos refugiados nos países vizinhos. Que os agentes humanitários, dedicados a aliviar os sofrimentos da população, tenham garantida a possibilidade de prestar a ajuda necessária.

O que podemos fazer pela paz no mundo? Como dizia o Papa João XXIII, a todos corresponde a tarefa de estabelecer um novo sistema de relações de convivência baseados na justiça e no amor (cf. Pacem in terris, [11 de abril de 1963]: AAS 55 [1963], 301-302).

Possa uma corrente de compromisso pela paz unir todos os homens e mulheres de boa vontade! Trata-se de um forte e premente convite que dirijo a toda a Igreja Católica, mas que estendo a todos os cristãos de outras confissões, aos homens e mulheres de todas as religiões e também àqueles irmãos e irmãs que não creem: a paz é um bem que supera qualquer barreira, porque é um bem de toda a humanidade.

Repito em alta voz: não é a cultura do confronto, a cultura do conflito, aquela que constrói a convivência nos povos e entre os povos, mas sim esta: a cultura do encontro, a cultura do diálogo: este é o único caminho para a paz.

Que o grito da paz se erga alto para que chegue até o coração de cada um, e que todos abandonem as armas e se deixem guiar pelo desejo de paz.

Por isso, irmãos e irmãs, decidi convocar para toda a Igreja, no próximo dia 7 de setembro, véspera da Natividade de Maria, Rainha da Paz, um dia de jejum e de oração pela paz na Síria, no Oriente Médio, e no mundo inteiro, e convido também a unir-se a esta iniciativa, no modo que considerem mais oportuno, os irmãos cristãos não católicos, aqueles que pertencem a outras religiões e os homens de boa vontade.

No dia 7 de setembro, na Praça de São Pedro, aqui, das 19h00min até as 24h00min, nos reuniremos em oração e em espírito de penitência para invocar de Deus este grande dom para a amada nação síria e para todas as situações de conflito e de violência no mundo. A humanidade precisa ver gestos de paz e escutar palavras de esperança e de paz! Peço a todas as Igrejas particulares que, além de viver este dia de jejum, organizem algum ato litúrgico por esta intenção.  

Peçamos a Maria que nos ajude a responder à violência, ao conflito e à guerra com a força do diálogo, da reconciliação e do amor. Ela é mãe: que Ela nos ajude a encontrar a paz; todos nós somos seus filhos! Ajudai-nos, Maria, a superar este momento difícil e a nos comprometer a construir, todos os dias e em todo lugar, uma autêntica cultura do encontro e da paz. Maria, Rainha da paz, rogai por nós!

Fonte: vatican.va
 Bênção do Papa às famílias brasileiras

Queridas famílias brasileiras,
Guardando vivas no coração as alegrias que me foram proporcionadas durante a recente visita ao Brasil, me sinto feliz em saudá-las por ocasião da Semana Nacional da Família, cujo tema é “A transmissão e a educação da fé cristã na família”, encorajando os pais nessa nobre e exigente missão que possuem de ser os primeiros colaboradores de Deus na orientação fundamental da existência e a segurança de um bom futuro. Para isso, “é importante que os pais cultivem as práticas comuns de fé na família, que acompanhem o amadurecimento de fé dos filhos” (Carta Enc. Lúmem Fidei, 53). Neste sentido, os pais são chamados a transmitir, tanto por palavras como, sobretudo pelas obras, as verdades fundamentais sobre a vida e o amor humano, que recebem uma nova luz da Revelação de Deus. De modo particular, diante da cultura do descartável, que relativiza o valor da vida humana, os pais são chamados a transmitir aos seus filhos a consciência de que esta deva sempre ser defendida, já desde o ventre materno, reconhecendo ali um dom de Deus e garantia do futuro da humanidade, mas também na atenção aos mais velhos, especialmente aos avós, que são a memória viva de um povo e transmissores da sabedoria da vida. Fazendo votos de que vocês, queridas famílias brasileiras, sejam o mais convincentes arautos da beleza do amor sustentado e alimentado pela fé e como penhor de graças do Alto, pela intercessão de Nossa Senhora Aparecida, a todos concedo a Benção Apostólica.
Francisco
A IGREJA É UM TEMPLO DE "PEDRAS VIVAS"

CATEQUESE
Praça São Pedro
Quarta-feira, 26 de junho de 2013

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje gostaria de fazer uma breve referência a outra imagem que nos ajuda a ilustrar o mistério da Igreja: aquela do templo (cfr Con. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, 6).

Em que nos faz pensar a palavra templo? Nos faz pensar em um edifício, em uma construção. De modo particular, a mente de muitos vai à história do Povo de Israel narrada no Antigo Testamento. Em Jerusalém, o grande Templo de Salomão era o lugar de encontro com Deus na oração; dentro do Templo havia a Arca da Aliança, sinal da presença de Deus em meio ao povo; e na Arca havia as Tábuas da Lei, o maná e a vara de Arão um lembrete de que Deus estava sempre dentro da história de seu povo, o acompanhava no caminho, guiava seus passos. O templo recorda essa história: também nós quando vamos ao templo devemos recordar esta história, cada um de nós a nossa história, como Jesus me encontrou, como Jesus caminhou comigo, como Jesus me ama e me abençoa.

Então, isso que era prefigurado no antigo Templo, é realizado, pelo poder do Espírito Santo, na Igreja: a Igreja é a “casa de Deus”, o lugar da sua presença, onde possamos encontrar e conhecer o Senhor; a Igreja é o Templo no qual mora o Espírito Santo que a anima, a guia e a apoia. Se nos perguntamos: onde podemos encontrar Deus? Onde podemos entrar em comunhão com Ele através de Cristo? Onde podemos encontrar a luz do Espírito Santo que ilumina a nossa vida? A resposta é: no povo de Deus, entre nós, que somos Igreja. Aqui encontraremos Jesus, o Espírito Santo e o Pai.

O antigo Templo era edificado pelas mãos dos homens: desejava-se “dar uma casa” a deus, para ter um sinal visível da sua presença em meio ao povo. Com a encarnação do Filho de Deus, cumpre-se a profecia de Natan ao rei Davi (cfr 2 Sam 7, 1-29): não é o reio, não somos nós a “dar uma casa a Deus”, mas é o próprio Deus que “constrói a sua casa” para vir e morar em meio a nós, como escreve São João em seu Evangelho (cfr 1,14). Cristo é o Templo vivo do Pai, e o próprio Cristo edifica a sua “casa espiritual”, a Igreja, feita não de pedras materiais, mas de ‘pedras vivas’, que somos nós. O Apóstolo Paulo diz aos cristãos de Éfeso: vós sois “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, tendo como pedra angular o próprio Cristo Jesus. Nele toda a construção cresce bem ordenada para ser templo santo do Senhor; Nele também vós sois edificados juntos para transformar-se morada de Deus por meio do Espírito Santo” (Ef 2,20-22). Isto é uma coisa bela! Nós somos as pedras vivas do edifício de Deus, unidos profundamente a Cristo, que é a pedra de sustentação e também de sustentação entre nós. O que isso quer dizer? Quer dizer que o templo somos nós, nós somos a Igreja viva, o templo vivo e quando estamos juntos entre nós há também o Espírito Santo, que nos ajuda a crescer como Igreja. Nós não somos isolados, mas somos povo de Deus: esta é a Igreja!

E é o Espírito Santo, com os seus dons, que desenha a variedade. Isto é importante: o que faz o Espírito Santo entre nós? Ele desenha a variedade que é a riqueza na Igreja e une tudo e todos, de forma a construir um templo espiritual, no qual oferecemos não sacrifícios materiais, mas nós mesmos, a nossa vida (cfr 1Pt 2,4-5). A Igreja não é um conjunto de coisas e de interesses, mas é o Templo do Espírito Santo, o Templo no qual Deus trabalha, o Templo do Espírito Santo, o Templo no qual Deus trabalha, o Templo no qual cada um de nós com o dom do Batismo é pedra viva. Isto nos diz que ninguém é inútil na Igreja e se alguém às vezes diz ao outro: “Vá pra casa, você é inútil”, isto não é verdade, porque ninguém é inútil na Igreja, todos somos necessários para construir este Templo! Ninguém é secundário. Ninguém é o mais importante na Igreja, todos somos iguais aos olhos de Deus. Alguém de vocês poderia dizer: “Ouça, Senhor Papa, o senhor não é igual a nós”. Sim, sou como cada um de vocês, todos somos iguais, somos irmãos! Ninguém é anônimo: todos formamos e construímos a Igreja. Isto nos convida também a refletir sobre o fato de que se falta o tijolo da nossa vida cristã, falta algo à beleza da Igreja. Alguns dizem: “Eu não tenho nada a ver com a Igreja”, mas assim pula o tijolo de uma vida neste belo Templo. Ninguém pode sair, todos devemos levar à Igreja a nossa vida, o nosso coração, o nosso amor, o nosso pensamento, o nosso trabalho: todos juntos.

Gostaria então que nos perguntássemos: como vivemos o nosso ser Igreja? Somos pedras vivas ou somos, por assim dizer, pedras cansadas, entediadas, indiferentes? Vocês viram como é ruim ver um cristão cansado, entediado, indiferente? Um cristão assim não vai bem, o cristão deve ser vivo, alegre por ser cristão; deve viver esta beleza de fazer parte do povo de Deus que é a Igreja. Nós nos abrimos à ação do Espírito Santo para ser parte ativa nas nossas comunidades ou nos fechamos em nós mesmos dizendo: “tenho tantas coisas a fazer, não é tarefa minha”?

O Senhor nos dê a todos a sua graça, a sua força, a fim de que possamos ser profundamente unidos a Cristo, que é a pedra angular, a pilastra, a pedra de sustentação da nossa vida e de toda a vida da Igreja. Rezemos para que, animados pelo seu Espírito, sejamos sempre pedras vivas da sua Igreja.

Fonte: Canção Nova
 Não denegrir o outro, mas seguir a lei do amor, pede Papa

“Quem ‘entra na vida cristã’, disse, tem exigências maiores que as dos outros; não maiores vantagens”, explica Francisco

Da Redação, com Rádio Vaticano
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(Foto:Arquivo L’Osservatore Romano)
 “Gostaria de pedir ao Senhor que conceda a graça a todos de prestar mais atenção às críticas que fazemos os outros. É uma pequena penitência que dá bons frutos”, disse Francisco.

Como todas as manhãs, o Papa Francisco celebrou a Missa, nesta quinta-feira, 13, na Capela da Casa Santa Marta, no Vaticano. Participaram da Celebração Eucarística representantes das Embaixadas e Consulados da Argentina na Itália e junto à FAO. O Santo Padre recordou que não celebra Missa em espanhol desde o dia 26 de fevereiro, antes do Consistório.

Em sua homilia, em espanhol, o Papa agradeceu aos presentes pelo trabalho que fazem pela Pátria, fora do país. A seguir, meditou sobre a Liturgia do dia, onde Jesus se dirige aos seus discípulos, dizendo: “Que a justiça de vocês seja superior àquela dos fariseus”. Esta exortação vem depois das Bem-Aventuranças e da citação “Jesus não veio para abolir a Lei, mas para aperfeiçoá-la”.

Com efeito, disse o Santo Padre, a reforma proposta por Jesus é “uma proposta sem ruptura, mas uma reforma na continuidade”: um processo que vai da ‘semente ao fruto’. Quem ‘entra na vida cristã’, disse, tem exigências maiores que as dos outros, não maiores vantagens”.

Depois, o Papa exortou “a não denegrirmos nem insultarmos o próximo, mas a trilharmos o caminho da fraternidade. A agressividade natural do homem, como aquela de Caim contra Abel, se repete na história da humanidade. Isso demonstra que somos pecadores e fracos. E concluiu:

“Gostaria de pedir ao Senhor que nos conceda a graça a todos de prestar mais atenção sobre as críticas que fazemos os outros. É uma pequena penitência que dá bons frutos. Peçamos ao Senhor a graça de adequar a nossa vida à lei da mansidão, do amor e da paz”!

Catequese do Papa Francisco

A Igreja, família de Deus

Queridos irmãos e irmãs, bom dia! 

Quarta-feira passada eu abordei o vínculo profundo entre o Espírito Santo e a Igreja. Hoje gostaria de começar algumas reflexões sobre o mistério da Igreja, mistério que todos nós vivemos e do qual fazemos parte. Quero utilizar expressões contidas nos textos do Concílio Vaticano II. 

Hoje, a primeira: a Igreja como Família de Deus. 

Nos últimos meses, mais de uma vez eu fiz referência à Parábola do Filho Pródigo, ou melhor, do Pai Misericordioso (cf. Lc 15:11-32). O filho mais novo deixa a casa do pai, desperdiça tudo e decide voltar porque percebe que cometeu um erro, mas já não é considerado digno de ser filho e pensa em poder ser recebido de volta como servo. Mas o pai corre ao seu encontro e o abraça, lhe restitui de volta sua dignidade de filho e faz festa. Esta parábola, como outras no Evangelho, mostra bem o desígnio de Deus para a humanidade. 

Qual é este plano de Deus? É fazer de todos nós uma única família de filhos, em que cada um se sinta próximo e amado por Ele, como na parábola do Evangelho, sinta o calor de ser família de Deus. Neste grande projeto, encontra sua raiz na Igreja, que não é uma organização fundada por pessoas, mas – como nos recordou tantas vezes o Papa Bento XVI – é obra de Deus, nasceu exatamente deste plano de amor que se concretiza progressivamente na história. A Igreja nasce do desejo de Deus de chamar todo homem à comunhão com Ele, à Sua amizade e a participar como filhos de sua vida divina. A própria palavra “Igreja”, do grego ekklesia, significa “convocação”: Deus nos chama, nos impulsiona a sair do individualismo, da tendência de nos fechar em nós mesmos e nos chama a fazer parte de sua família. E este chamado tem origem na própria criação. Deus nos criou para que vivêssemos em uma relação de profunda amizade com Ele e até mesmo quando o pecado quebrou esta relação com Deus, com os outros e com a criação, Deus não nos abandonou. Toda a história da salvação é a história de Deus que busca o homem, oferece-lhe seu amor, o acolhe. Ele chamou Abraão para ser o pai de uma multidão, escolheu o povo de Israel para firmar uma aliança que abraçasse todas as nações e enviou, na plenitude dos tempos, seu Filho, para que seu plano de amor e salvação fosse realizado em uma nova e eterna aliança com toda a humanidade. Quando lemos os Evangelhos, vemos que Jesus reúne em torno de si uma pequena comunidade que acolhe a sua palavra, segue-o, compartilha sua jornada, se torna Sua família e com esta comunidade Ele prepara e constrói Sua Igreja. 

Onde nasce a Igreja, então? Nasce do supremo ato de amor na Cruz, do lado trespassado de Jesus, de onde jorram sangue e água, símbolo dos sacramentos da Eucaristia e do Batismo. Na família de Deus, na Igreja, a seiva vital é o amor de Deus que se constitui em amá-Lo e amar os outros, todos, sem distinção e medida. A Igreja é uma família em que se ama e é amado. 

Quando se manifesta a Igreja? Celebramos esse momento há dois domingos. Se manifesta quando o dom do Espírito Santo enche o coração dos Apóstolos e os impele a sair e começar o caminho para anunciar o Evangelho, espalhar o amor de Deus. 

Mesmo hoje em dia, alguém diz: “Cristo sim, a Igreja não”. Como aqueles que dizem “eu acredito em Deus, mas não nos sacerdotes”. Mas é a Igreja que nos leva a Cristo, que nos leva a Deus, a Igreja é a grande família dos filhos de Deus. Claro que há também aspectos humanos, naqueles que a compõem, pastores e fiéis, há defeitos, imperfeições, pecados e o Papa também os tem e são muitos, mas o belo é que, quando nos damos conta de que somos pecadores, encontramos a misericórdia de Deus, que sempre perdoa. Não se esqueça: Deus sempre perdoa e nos recebe em seu amor de perdão e misericórdia. Alguns dizem que o pecado é uma ofensa a Deus, mas também uma oportunidade de humilhação para perceber que não há nada mais belo: a misericórdia de Deus. Pensemos nisso. 

Nos perguntemos hoje: quanto amo a Igreja? Rezo por ela? Eu me sinto parte da família da Igreja? O que faço para que seja uma comunidade onde todos se sintam acolhidos e compreendidos, sintam a misericórdia e o amor de Deus que renova a vida? A fé é um dom e um ato que nos afeta pessoalmente, mas Deus nos chama a viver a nossa fé juntos, como família, como Igreja. 

Peçamos ao Senhor, de maneira especial neste Ano da Fé, que as nossas comunidades, toda a Igreja, sejam cada vez mais verdadeiras famílias que vivem e levam o calor de Deus.

Seguir Jesus não é fazer carreira, disse o Papa Francisco

Missa na Casa Santa Marta

Segundo o Papa, o seguimento de Cristo não deve ser motivado por interesses pessoais ou materiais

Da redação, com Rádio Vaticano
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Seguir Jesus não é fazer carreira, disse o Papa Francisco durante Missa nesta terça-feira, 28. (FOTO: L’Osservatore Romano)

Nesta terça-feira, 28, em sua Missa diária celebrada na capela da Casa Santa Marta, o Papa Francisco afirmou que o seguimento e o anúncio de Jesus não significam fazer carreira. Segundo ele, seguir Jesus não confere maior poder, porque o Seu caminho é o da Cruz.

“O caminho do Senhor é o do rebaixamento, e esta é a razão pela qual sempre há dificuldades e perseguições”, comentou. Francisco advertiu que “quando um cristão não encontra dificuldades na vida – achando que tudo está indo bem, que tudo é lindo – significa que alguma coisa está errada”.

O Papa desenvolveu sua homilia partindo do comentário que Pedro faz a Jesus: “Eis que nós deixamos tudo e te seguimos”. Jesus responde que aqueles que O seguirem terão “muitas coisas boas”, mas sofrerão “perseguições”. Para Francisco, o seguimento de Jesus não deve ser motivado por interesses pessoais ou materiais.

“Quem acompanha Jesus como um ‘projeto cultural’, usa esta estrada para subir na vida, para ter mais poder. E a história da Igreja tem muito disso, começando por certos imperadores, governantes… e também alguns – não muitos, mas alguns – padres e bispos, não é? Alguns deles pensam que seguir Jesus é fazer carreira”.

O Papa lembrou que, tempos atrás, se dizia: “aquele menino quer fazer a carreira eclesiástica”; e, segundo ele, ainda hoje, muitos cristãos pensam que seguir Jesus é bom, porque se pode fazer carreira. “O cristão, porém, segue Jesus por amor”, afirmou o Pontífice.

Francisco explica que outra tendência do espírito ‘mundano’ é a de não tolerar o testemunho:

“Pensem em Madre Teresa: dizem que era uma bela mulher, que fez muito pelos outros, mas o espírito ‘mundano’ nunca disse que a Beata Teresa, todos os dias, por horas, fazia adoração… Costuma-se reduzir a atividade cristã ao bem social, como se a existência cristã fosse um verniz, uma pátina de Cristianismo. O anúncio não é uma pátina: vai aos ossos, ao coração, dentro de nós e nos transforma. Isso o espírito ‘mundano’ não tolera e aí acontecem as perseguições”.

Terminando, o Papa pediu à Igreja a graça de seguir Jesus no caminho que Ele ensinou, mesmo que o espírito ‘mundano’ a faça sofrer. “O Senhor nunca nos deixa sozinhos”, disse.


SOLENIDADE DE PENTECOSTES
SANTA MISSA COM OS MOVIMENTOS ECLESIAIS
HOMILIA DO SANTO PADRE FRANCISCO
Praça de São Pedro
Domingo, 19 de Maio de 2013
 Amados irmãos e irmãs
Neste dia, contemplamos e revivemos na liturgia a efusão do Espírito Santo realizada por Cristo ressuscitado sobre a sua Igreja; um evento de graça que encheu o Cenáculo de Jerusalém para se estender ao mundo inteiro.
Então que aconteceu naquele dia tão distante de nós e, ao mesmo tempo, tão perto que alcança o íntimo do nosso coração? São Lucas dá-nos a resposta na passagem dos Actos dos Apóstolosque ouvimos (2, 1-11). O evangelista leva-nos a Jerusalém, ao andar superior da casa onde se reuniram os Apóstolos. A primeira coisa que chama a nossa atenção é o rombo improviso que vem do céu, «comparável ao de forte rajada de vento», e enche a casa; depois, as «línguas à maneira de fogo» que se iam dividindo e pousavam sobre cada um dos Apóstolos. Rombo e línguas de fogo são sinais claros e concretos, que tocam os Apóstolos não só externamente mas também no seu íntimo: na mente e no coração. Em consequência, «todos ficaram cheios do Espírito Santo», que esparge seu dinamismo irresistível com efeitos surpreendentes: «começaram a falar outras línguas, conforme o Espírito lhes inspirava que se exprimissem». Abre-se então diante de nós um cenário totalmente inesperado: acorre uma grande multidão e fica muito admirada, porque cada qual ouve os Apóstolos a falarem na própria língua. É uma coisa nova, experimentada por todos e que nunca tinha sucedido antes: «Ouvimo-los falar nas nossas línguas». E de que falam? «Das grandes obras de Deus».
À luz deste texto dos Actos, quereria reflectir sobre três palavras relacionadas com a acção do Espírito: novidade, harmonia e missão.
1. A novidade causa sempre um pouco de medo, porque nos sentimos mais seguros se temos tudo sob controle, se somos nós a construir, programar, projectar a nossa vida de acordo com os nossos esquemas, as nossas seguranças, os nossos gostos. E isto verifica-se também quando se trata de Deus. Muitas vezes seguimo-Lo e acolhemo-Lo, mas até um certo ponto; sentimos dificuldade em abandonar-nos a Ele com plena confiança, deixando que o Espírito Santo seja a alma, o guia da nossa vida, em todas as decisões; temos medo que Deus nos faça seguir novas estradas, faça sair do nosso horizonte frequentemente limitado, fechado, egoísta, para nos abrir aos seus horizontes. Mas, em toda a história da salvação, quando Deus Se revela traz novidade – Deus traz sempre novidade - , transforma e pede para confiar totalmente n’Ele: Noé construiu uma arca, no meio da zombaria dos demais, e salva-se; Abraão deixa a sua terra, tendo na mão apenas uma promessa; Moisés enfrenta o poder do Faraó e guia o povo para a liberdade; os Apóstolos, antes temerosos e trancados no Cenáculo, saem corajosamente para anunciar o Evangelho. Não se trata de seguir a novidade pela novidade, a busca de coisas novas para se vencer o tédio, como sucede muitas vezes no nosso tempo. A novidade que Deus traz à nossa vida é verdadeiramente o que nos realiza, o que nos dá a verdadeira alegria, a verdadeira serenidade, porque Deus nos ama e quer apenas o nosso bem. Perguntemo-nos hoje a nós mesmos: Permanecemos abertos às «surpresas de Deus»? Ou fechamo-nos, com medo, à novidade do Espírito Santo? Mostramo-nos corajosos para seguir as novas estradas que a novidade de Deus nos oferece, ou pomo-nos à defesa fechando-nos em estruturas caducas que perderam a capacidade de acolhimento? Far-nos-á bem pormo-nos estas perguntas durante todo o dia.
2. Segundo pensamento: à primeira vista o Espírito Santo parece criar desordem na Igreja, porque traz a diversidade dos carismas, dos dons. Mas não; sob a sua acção, tudo isso é uma grande riqueza, porque o Espírito Santo é o Espírito de unidade, que não significa uniformidade, mas a recondução do todo à harmonia. Quem faz a harmonia na Igreja é o Espírito Santo. Um dos Padres da Igreja usa uma expressão de que gosto muito: o Espírito Santo «ipse harmonia est – Ele próprio é a harmonia». Só Ele pode suscitar a diversidade, a pluralidade, a multiplicidade e, ao mesmo tempo, realizar a unidade. Também aqui, quando somos nós a querer fazer a diversidade fechando-nos nos nossos particularismos, nos nossos exclusivismos, trazemos a divisão; e quando somos nós a querer fazer a unidade segundo os nossos desígnios humanos, acabamos por trazer a uniformidade, a homogeneização. Se, pelo contrário, nos deixamos guiar pelo Espírito, a riqueza, a variedade, a diversidade nunca dão origem ao conflito, porque Ele nos impele a viver a variedade na comunhão da Igreja. O caminhar juntos na Igreja, guiados pelos Pastores – que para isso têm um carisma e ministério especial – é sinal da acção do Espírito Santo; uma característica fundamental para cada cristão, cada comunidade, cada movimento é a eclesialidade. É a Igreja que me traz Cristo e me leva a Cristo; os caminhos paralelos são muito perigosos! Quando alguém se aventura ultrapassando (proagon) a doutrina e a Comunidade eclesial – diz o apóstolo João na sua Segunda Carta - e deixa de permanecer nelas, não está unido ao Deus de Jesus Cristo (cf. 2 Jo v. 9). Por isso perguntemo-nos: Estou aberto à harmonia do Espírito Santo, superando todo o exclusivismo? Deixo-me guiar por Ele, vivendo na Igreja e com a Igreja?
3. O último ponto. Diziam os teólogos antigos: a alma é uma espécie de barca à vela; o Espírito Santo é o vento que sopra na vela, impelindo-a para a frente; os impulsos e incentivos do vento são os dons do Espírito. Sem o seu incentivo, sem a sua graça, não vamos para a frente. O Espírito Santo faz-nos entrar no mistério do Deus vivo e salva-nos do perigo de uma Igreja gnóstica e de uma Igreja narcisista, fechada no seu recinto; impele-nos a abrir as portas e sair para anunciar e testemunhar a vida boa do Evangelho, para comunicar a alegria da fé, do encontro com Cristo. O Espírito Santo é a alma da missão. O sucedido em Jerusalém, há quase dois mil anos, não é um facto distante de nós, mas um facto que nos alcança e se torna experiência viva em cada um de nós. O Pentecostes do Cenáculo de Jerusalém é o início, um início que se prolonga. O Espírito Santo é o dom por excelência de Cristo ressuscitado aos seus Apóstolos, mas Ele quer que chegue a todos. Como ouvimos no Evangelho, Jesus diz: «Eu apelarei ao Pai e Ele vos dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco» (Jo 14, 16). É o Espírito Paráclito, o «Consolador», que dá a coragem de levar o Evangelho pelas estradas do mundo! O Espírito Santo ergue o nosso olhar para o horizonte e impele-nos para as periferias da existência a fim de anunciar a vida de Jesus Cristo. Perguntemo-nos, se tendemos a fechar-nos em nós mesmos, no nosso grupo, ou se deixamos que o Espírito Santo nos abra à missão. Recordemos hoje estas três palavras: novidade, harmonia, missão.
A liturgia de hoje é uma grande súplica, que a Igreja com Jesus eleva ao Pai, para que renove a efusão do Espírito Santo. Cada um de nós, cada grupo, cada movimento, na harmonia da Igreja, se dirija ao Pai pedindo este dom. Também hoje, como no dia do seu nascimento, a Igreja invoca juntamente com Maria: «Veni Sancte Spiritus… – Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor»! Amen.
 Fonte: Libreria Editrice Vaticana